Dados editoriais
Em Junho de 1925, a redacção de A Batalha decidiu iniciar um novo empreendimento editorial, após ter incentivado a Confederação Geral do Trabalho (CGT) a patrocinar a criação do Suplemento, em Dezembro de 1923. Apesar do sucesso comercial do semanário, os leitores reclamavam uma melhoria gráfica da publicação, reproduções mais nítidas das ilustrações e a impressão em papel de melhor qualidade. A secção editorial de A Batalha respondeu a estas exigências, alegando que o preço de 50 centavos do Suplemento impedia que a revista fosse impressa em máquina plana ou que o papel de impressão fosse melhorado. O aumento do seu valor podia, ainda, prejudicar o trabalho de propaganda que o semanário tinha iniciado, afastando grande parte dos seus leitores. Mas a importância atribuída pela redacção de A Batalha à colaboração artística, que estava a ser prejudicada pelas limitações financeiras do Suplemento, levou-a a constatar a necessidade premente de avançar com uma nova iniciativa editorial, na qual essas deficiências pudessem ser corrigidas.
Assim, para corresponder às expectativas de alguns leitores insatisfeitos, surgiu a vontade de iniciar a publicação de uma revista quinzenal de arte, literatura e actualidades, que se intitulou Renovação. A secção editorial confrontava-se, todavia, com a desconfiança do Conselho Confederal em relação à orientação dos dois órgãos na imprensa da CGT: além de repudiar o posicionamento ambíguo de A Batalha perante o governo de José Domingues dos Santos, também analisava criticamente a propaganda conduzida pelo Suplemento. No centro da controvérsia encontrava-se Manuel da Silva Campos, que acumulava as funções de secretário-geral da CGT com as de director da imprensa confederal. Perante este contexto adverso às intenções da secção editorial, o Conselho Confederal, reunido no final de Junho, aprovou a moção de Almeida Marques, favorável à suspensão imediata do lançamento da revista, até que Aleixo de Oliveira, administrador de A Batalha, apresentasse um relatório sobre o assunto ao organismo.
A verdade é que logo no dia 2 de Julho foi publicado o primeiro número da Renovação, em contradição com a vontade expressada pelo Conselho. O nascimento da revista revelaria a crescente autonomia decisória da redacção liderada por António Pinto Quartim, que estava patente, desde logo, na informação de que a nova publicação seria propriedade da secção editorial de A Batalha e não da CGT, como acontecia com o diário e semanário. Para dirigir formalmente a revista, o nome escolhido foi o de um militante próximo do secretário-geral, o metalúrgico Manuel Gonçalves Vidal, que, contudo, só desempenharia a função durante os dois primeiros números. José da Silva Santos Arranha tornou-se director a partir do n.º 3, quando passou a coordenar toda a imprensa da CGT, em substituição de Silva Campos, que tinha ficado numa posição muito fragilizada após a reunião do Conselho Confederal de final de Junho. O cargo de editor foi ocupado pelo servente da construção civil Alexandre de Assis, velho conhecido de Quartim, com quem tinha estado preso no Limoeiro, em 1913. Esta proximidade pode explicar a razão pela qual se manteve em funções do primeiro ao último número da Renovação, uma situação singular na vida das diversas publicações periódicas da confederação anarco-sindicalista.
Publicada ininterruptamente até 15 de Junho de 1926, data em que se editou o 24º e derradeiro número, a revista de novos horizontes sociais saía para as ruas e tabacarias nos dias 1 e 15 de cada mês, com o valor de 1$50. Com capa a três cores, a Renovação apresentou uma rica colaboração gráfica, que acompanhava as 16 páginas de artigos sobre literatura de cariz social ou de actualidade artística e científica. Exigindo-se uma qualidade de reprodução que não podia ser alcançada pela impressão em máquina rotativa, o trabalho era encomendado à Imprensa Beleza, situada na Rua da Rosa. Não muito longe encontrava-se a morada da redacção e administração, no antigo palácio Marim-Olhão, no 2º andar do 38-A da Calçada do Combro, onde também se realizavam os necessários arranjos tipográficos.
Ao que tudo indica, a Renovação foi um sucesso comercial, possivelmente por abrir as suas páginas a ilustradores e articulistas que não circulavam habitualmente no espaço anarquista, como seria o caso de Rocha Martins, fundador do ABC. As relações entre as redacções das duas revistas seriam, muito provavelmente, de grande proximidade, devido à importante colaboração de Ferreira de Castro, Mário Domingues, Stuart Carvalhais, Rocha Vieira ou Roberto Nobre para ambas as publicações. Esta terá sido uma das razões que levou o jornal O Anarquista a iniciar uma violenta campanha contra os "jornalistas profissionais" que se tinham instalado na redacção de A Batalha e das suas duas revistas, aproveitando para questionar a orientação ideológica dos colaboradores da Renovação. Os jovens sindicalistas alegavam que o trabalho propagandístico do periódico era descurado, que a redacção se aproveitava dos diminutos recursos e do esforço dos militantes confederados e que as subscrições de apoio à revista serviam apenas para alimentar uma "cáfila de comilões". Naturalmente, o órgão da União Anarquista Portuguesa saudou o desaparecimento da revista em meados de Junho.
Com o fim da publicação, a Renovação deixou para a administração de A Batalha um importante lucro de 6444$65. No início de Julho, surgiu no diário operário a indicação de que se tratava de uma interrupção temporária da publicação, que se devia à necessidade de reformular os serviços gráficos e redactoriais. A clivagem entre a CGT e a redacção e direcção de A Batalha, porém, impossibilitou que a empresa fosse reanimada. Nesse mesmo mês, Quartim, provavelmente o principal impulsionador da revista, abandonava a redacção, após reagir às alegações de O Anarquista, e, em Agosto, era a vez de Arranha ser afastado da direcção das publicações periódicas cegetistas. No período de reorganização interna que se seguiu, não havia espaço para uma publicação conotada com o arranhismo, pelo que restou recuperar, sanear e preparar o diário e o Suplemento para as difíceis disputas que se aproximavam.
António Baião