João de Barros
João do Rio
Graça Aranha

Dados editoriais

Desde 1909, Manuel de Sousa Pinto, polígrafo português nascido no Brasil que dirigira a revista Arte & Vida, João de Barros, seu amigo próximo e antigo co-director deste periódico de arte, crítica e ciência, e João do Rio, jornalista e cronista carioca afamado, desenvolveram diligências no sentido de publicarem um mensário, para o qual o primeiro sugeriu o título Atlântica, destinado a vencer a distância entre as duas costas oceânicas e a esbater as respectivas idiossincrasias continentais.

Foi, porém, necessário esperar seis anos para que a empresa vingasse, não com o respaldo comercial dos relutantes irmãos Lello, a quem os três promotores se dirigiram inicialmente, mas com a subvenção do Itamaraty e das Necessidades, numa época em que aos laços históricos e ao movimento migratório se somavam afinidades republicanas celebradas e interesses comuns face à ameaça pangermânica.

Atlantida – como o mensário artístico, literário e social para Portugal e Brazil acabou por se designar – estreou-se nos escaparates a 15 de Novembro de 1915. João do Rio, pseudónimo de Paulo Barreto, figurava como o director para o Brasil, enquanto João de Barros surgia como director em Portugal. Elísio de Campos era o secretário de redacção indicado e Pedro Bordallo Pinheiro apareceu como editor. A redacção estava sediada na Rua Barata Salgueiro, n.º 41, r/c, e a administração instalou-se no Largo do Conde Barão, n.º 49. A Imprensa Libanio da Silva, na Travessa do Fala-Só, n.º 24, respondia pela composição e pela impressão.

O anúncio do "alto patrocínio de S. Exas. os ministros das relações exteriores do Brasil e dos estrangeiros e fomento de Portugal", que ocupou a página de abertura das primeiras vinte e cinco edições do mensário, assinala quer o seu viés político-cultural da publicação quer a vulnerabilidade da iniciativa face às linhas incertas que tecem o exercício do poder.

A qualidade da edição mostrou-se condizente com os apoios institucionais recebidos, tanto no que respeita à colaboração de escritores, publicistas e ilustradores de mérito quanto no cuidado posto na escolha do papel e na composição.

Embora o mensário tenha concretizado um desígnio partilhado por intelectuais dos dois lados do oceano, o simples facto de a sua sede e produção terem lugar em Lisboa indicia a prevalência da antiga metrópole na revista, reflectida igualmente na dificuldade sentida para a fazer circular – por problemas de expedição, alfandegários e de distribuição – para além das fronteiras lusas.

A quarta edição, de 15 de Fevereiro de 1916, indica que a redacção passou a ter o mesmo endereço postal da administração – Largo do Conde Barão, n.º 49 – mudança a que as circunstâncias de a empresa de fotogravação Bordallo Pinheiro Lallemant, Lda aí estar instalada e de Pedro Bordallo Pinheiro ser editor e esteio da publicação não foram decerto alheias.

Este trânsito mostrou-se, porém, breve, pois em Junho do mesmo ano a sede da redacção mudou para o mais apropriado Chiado, na Rua António Maria Cardoso, n.º 26. A sala que serviu de ponto de encontro aos directores, escritores e outros articulistas foi aprimorada por Raul Lino e inaugurada com alguma solenidade. Confinava com a Agência Telegráfica Americana, dirigida por Moreira Teles, colaborador do periódico. O local servira de atelier a Manuel Gustavo Bordalo Pinheiro e veio a alojar, pouco depois, a Seara Nova.

Entretanto, João do Rio tinha estabelecido a administração brasileira da revista no n.º 128 da cosmopolita Avenida Rio Branco, no Rio de Janeiro, e prosseguido as negociações com os distribuidores, com o sucesso, no que respeita ao sul do Brasil, anunciado na edição de Dezembro de 1916.

Publicada mensalmente até à Primavera de 1918, a Atlantida conheceu, de seguida, um período de dois anos de edições irregulares. Com data de Março-Abril de 1918 foi dado à estampa o primeiro fascículo duplo, justificado pelas greves recentes dos tipógrafos. Se o número seguinte, o 31, saiu com a indicação de uma periocidade retomada, já o n.º 32 não especifica o momento de publicação, enquanto a edição subsequente reincidiu na condição de número duplo e remete tão-só para o ano de 1919.

Apesar de a falha na publicação de metade dos fascículos previstos para 1918 ser justificada com "motivos de ordem puramente pessoal do editor", em artigo de abertura do n.º 33-34, que refere igualmente a "mesquinhez dos nossos recursos", não é de perder de vista que os defensores da participação portuguesa na Grande Guerra viveram momentos muito adversos durante a governação sidonista.

O número duplo referido, dedicado à vitória dos aliados, assinala igualmente algumas alterações profundas nos órgãos do mensário, que passou a ter como director técnico Pedro Bordallo Pinheiro, como secretário de redacção Bourbon e Menezes e como editor José Baptista Águas, ao mesmo tempo que a actividade redactorial e de gestão surgiram reunidas novamente no Largo do Conde Barão, 49.

Porém, a tentativa ensaiada para encontrar uma condição estável para a revista revelou-se muito precária, pois vingou unicamente em dois números, já que no n.º 37, datado igualmente de 1919, a Atlantida sofreu uma última remodelação de fundo, ao surgir como Orgão do pensamento latino no Brasil e em Portugal e apresentar três directores com funções editoriais. Graça Aranha, figura como director para França, a par de João do Rio, director para o Brasil, e de João de Barros, director para Portugal. Nuno Simões aparece como director gerente e Sebastião Mesquita como editor. A redacção e administração transferem-se para as instalações da Livraria Bertrand, na Rua Garrett, 73-75. A composição e impressão mantêm-se na Imprensa Libanio da Silva até à quadragésima edição, altura que mudam para a Tipografia do Anuário Comercial, na Praça dos Restauradores, 24. Aproximadamente na mesma altura, a revista passou a proprietária da Editora Fulmen, Lda. Um pouco mais tarde, no n.º 41, Vergílio Correia foi indicado como secretário de redacção.

Apesar de a defesa da civilização latina ser um desígnio expresso do periódico desde os seus primeiro textos programáticos, na medida em que encerraria em si os valores universais que uniriam os portugueses aos brasileiros e estes aos povos de filiação clássica, em oposição à falta de humanismo de eslavos, germânicos e saxões, a viragem que a revista sofreu nesta sua última fase ficou a dever-se, no essencial, à quebra dos apoios iniciais, à dificuldade em conquistar leitores brasileiros e à necessidade de obter novas fontes de financiamento.

A solução aliadófila também serviria, caso o Foreign Office tivesse subvencionado o empreendimento, o que não se verificou pois as diligências do embaixador Teixeira Gomes revelaram-se infrutíferas.

Sorte diferente teve Graça Aranha que obteve não só subsídio do departamento de propaganda do Quai d’Orsay como também o concurso da publicidade de empresas europeias com interesses no Brasil.

Se a leitura dos últimos fascículos da Atlantida torna patente que a passagem a órgão do pensamento latino e a revista multilíngue, com artigos em francês, italiano, castelhano e galego, não a descaracterizaram, pois os enxertos híbridos que passou a incluir nas suas páginas não se revelaram capazes de reformular o seu teor geral, é também seguro que não lhe conferiram a nova identidade almejada.

Na publicação dos n.ºs 39 e 40, datados respectivamente de Junho e de Julho de 1919, pode ver-se um derradeiro esforço para a revista regressar à periodicidade mensal, indispensável a um título que se queria prestigiado e com apoios políticos e comerciais estáveis. Tratou-se, contudo, de uma tentativa inglória, mesmo com o recurso regular ao anúncio e à publicação de fascículos duplos.

Em 1920, a revista conheceu as suas edições derradeiras, o fascículo 46-47, previsto para 15 de Fevereiro, em que a saída de João de Barros da direcção é dada a conhecer, e o fascículo 48, na Primavera do mesmo ano.

A administração abandonou, então, definitivamente o Largo do Conde Barão, 49, e a redacção retirou-se da Rua Nova do Carmo, 35, 2º., instalações para onde se tinham mudado após a edição do n.º 40.

Luís Andrade