António Sérgio
Augusto Reis Machado

Dados editoriais

Pela Grei foi dirigida por António Sérgio e secretariada por Augusto Reis Machado. Sendo “Pela lei e pela grei” a divisa da revista Nação Portuguesa, órgão de propaganda do integralismo lusitano, é possível que os mentores de Pela Grei pretendessem demarcar-se daquele campo ideológico, disputando conceitos, e é factual o pendor nacionalista que a enforma.

O artigo “Do intuito e natureza desta revista”, não assinado, como os demais editoriais, desenha o compromisso editorial: convocar a Grei, a consciência e o “interesse da comunidade” para a ação comum e a concórdia perante os despojos dos dias, em nome de uma profunda mudança económica e financeira, que se traduziria no aumento da produção e na melhor redistribuição social dos rendimentos. E quem a faria? “Especialistas” apoiados num governo nacional, por sua vez apoiado na “opinião pública”.

Atente-se a dois bloqueios de diagnóstico que sustentam a ambição reformadora: a crise secular, produzida pelas invasões e pela perda do Brasil, e a submersão dos interesses e clientelas nos partidos políticos. Estas duas vertentes permanecem dados da história nacional e apenas Mouzinho da Silveira é visto como o pioneiro reformador, pela libertação da agricultura e, por arrasto, da indústria e do comércio. Por outro lado, mais nada de transformador se reconhece num século, assumindo-se que os movimentos políticos falharam. Expressando-se a vontade do pensar coletivo contra as paixões políticas, assume-se em simultâneo a convocatória da “verdadeira Democracia” e a vontade de libertar a República das “taras jacobino-demagógicas”.

Dado o enfoque na urgência da reforma económica e financeira, não se estranharão os longos e detalhados artigos de Ezequiel de Campos, que diagnosticam e propõem reformas, opção que se sublinha logo no primeiro número, qual reflexo especular de Mouzinho da Silveira no reconhecimento do papel da terra nas necessárias mudanças estruturais da economia. A António Sérgio se deve a análise de questões políticas e sociais, com destaque para a crítica dos modelos de ensino dominantes e aposta em novos modelos. E embora se possa identificar um conjunto alargado de articulistas, a partir do 3.º número da revista ela assume-se como o projeto de António Sérgio e de Ezequiel de Campos, sendo que o número de artigos assinados pelo segundo é superior ao do primeiro.

O que os ligava para persistirem, solitários, nos seus ensejos de Reforma? A noção partilhada de um sistema partidário capturado pelos interesses da oligarquia, a ideia de uma “Revolução” que convertesse as elites e reformasse a estrutura produtiva, que assegurasse o progresso económico e a redistribuição da riqueza; unia-os a condenação das “paixões políticas”, a procura do “homem novo”, a condenação da “luta de classes”1, sempre pejorativamente adjetivada em nome de um ideal de cooperação e solidariedade entre classes2.

O projeto foi fugaz e, em 1926, os caminhos divergiram: enquanto Ezequiel de Campos alinhou com a situação e, preservando a critica aos interesses agrários dominantes, não deixou de ocupar cargos de destaque, nomeadamente o de procurador da Câmara Corporativa (1935-1965), António Sérgio viu-se exilado, e, com os adversários do passado, distinguiu-se como opositor ao regime.

Cecília Honório


  1. Sobre a reforma das elites, o conceito de Revolução ou a condenação do conceito de luta de classes (“estreito”, “mesquinho”, “erróneo”), ver o artigo, não assinado, “Da necessidade de as elites fazerem uma revolução pacífica”, Pela Grei, n.º 4, pp. 194-198.↩︎

  2. Uma ideia “despicienda e perturbadora”, Pela Grei, “A situação económica e social. O morbo gaulês”, n.º 5, p. 269.↩︎